Imagine um vazamento de petróleo no oceano sendo "limpo" por microrganismos que se alimentam do óleo. Ou um rio contaminado por metais pesados sendo despoluído por plantas que absorvem toxinas.
Esses são exemplos da biotecnologia ambiental em ação, uma área que emprega seres vivos e processos biológicos para solucionar crises ecológicas.
No Brasil, existem milhões de áreas contaminadas por atividades industriais e agrícolas. A biorremediação, técnica-chave dessa ciência, surge como uma solução sustentável e econômica. Neste artigo, vamos falar sobre como essa tecnologia transforma poluição em recursos.
O que é a biotecnologia ambiental?
A biotecnologia ambiental é o uso de microrganismos, plantas e enzimas para prevenir, monitorar ou remediar danos ao meio ambiente. Seu foco principal é a biorremediação, processo que aproveita a capacidade natural de seres vivos de degradar, absorver ou transformar poluentes em substâncias menos nocivas.
As bactérias do gênero Pseudomonas, por exemplo, são microrganismos muito versáteis e eficazes na degradação de diversos tipos de poluentes, incluindo derivados de petróleo. Em solos contaminados, essas bactérias utilizam os compostos presentes no petróleo como fonte de carbono e energia para seu crescimento e reprodução.
O processo funciona da seguinte maneira: as bactérias secretam enzimas que quebram as moléculas complexas dos derivados de petróleo em moléculas menores e mais simples. Essas moléculas menores são então metabolizadas pelas bactérias, resultando na produção de subprodutos como água (H₂O) e dióxido de carbono (CO₂), que são menos nocivos.
Isso pode ser feito para:
- Descontaminar solos, água e ar afetados por químicos industriais, agrotóxicos ou metais pesados;
- Reduzir danos ecológicos em setores como mineração, agricultura e energia;
- Promover a economia circular, transformando resíduos em recursos (como a produção de biogás a partir de lixo orgânico).
Como funciona a biorremediação de poluentes?
O processo de biorremediação ocorre em três etapas principais: identificação do poluente, seleção do agente biológico e aplicação da técnica.
- Identificação do poluente: esta é a primeira etapa e envolve a análise química para determinar qual contaminante está presente no solo ou na água. Por exemplo, pode-se identificar a presença de metais pesados como chumbo ou contaminantes orgânicos como pesticidas. Esta identificação é fundamental para escolher a abordagem correta para a biorremediação, pois diferentes contaminantes requerem diferentes estratégias de tratamento;
- Seleção do agente biológico: após a identificação do poluente, é feita a seleção do agente biológico adequado para degradar ou remover o contaminante. Esses agentes podem ser microrganismos, como bactérias e fungos, ou plantas. A escolha do agente biológico depende do tipo de poluição e das condições ambientais do local contaminado.
- Aplicação da técnica: existem duas abordagens principais para a aplicação da biorremediação:
- Bioaumentação: esta técnica envolve a introdução de microrganismos modificados ou de alta eficiência no local contaminado. Esses microrganismos são selecionados ou geneticamente modificados para serem especialmente eficazes na degradação do poluente específico;
- Bioestimulação: nesta abordagem, são adicionados nutrientes e outros compostos ao local contaminado para estimular a atividade dos microrganismos naturais que já estão presentes no ambiente. A adição desses nutrientes acelera a degradação dos poluentes.
Um exemplo real de aplicação de biorremediação ocorreu na Baía de Guanabara, em que houve um resultado positivo para cerca de 93% das amostras testadas.
Microrganismos usados na biorremediação
As bactérias Deinococcus radiodurans são conhecidas por sua incrível capacidade de resistir à radiação. Elas conseguem sobreviver em ambientes altamente radioativos, que seriam letais para a maioria dos seres vivos.
Além disso, essas bactérias têm a capacidade de decompor solventes clorados, que são compostos químicos frequentemente encontrados em resíduos industriais e que podem ser prejudiciais ao meio ambiente.
O fungo Phanerochaete chrysosporium tem uma habilidade de decompor a lignina, um dos principais componentes da madeira. Ele é especialmente eficaz na digestão de madeira tratada com creosoto, uma substância cancerígena utilizada como preservativo de madeira.
A capacidade desse fungo de degradar compostos tóxicos torna-o uma ferramenta valiosa na biorremediação de ambientes contaminados.
As leveduras Saccharomyces cerevisiae, amplamente utilizadas na produção de cerveja e pão, também têm aplicações na biorremediação. Elas são capazes de remover metais pesados, como o cádmio, de efluentes industriais.
Metais pesados são poluentes tóxicos que podem causar danos ao meio ambiente e à saúde humana, e o uso dessas leveduras pode ajudar a reduzir esses riscos.
Em uma inovação promissora, pesquisadores da USP desenvolveram uma linhagem de bactérias geneticamente modificadas para detectar a presença de aspirina, ácido benzoico e outras substâncias. Assim, elas fazem a digestão e tratamento de substâncias nocivas para os humanos e para o meio ambiente.
Nanotecnologia e biorremediação
A combinação de nanopartículas com microrganismos potencializa a descontaminação ambiental de diversas formas. As nanopartículas magnéticas têm a capacidade de capturar metais pesados presentes na água, facilitando sua remoção de forma eficiente.
Esses metais pesados, como mercúrio e chumbo, são poluentes tóxicos que podem causar sérios danos ao meio ambiente e à saúde humana. Ao serem capturados pelas nanopartículas magnéticas, esses metais podem ser facilmente extraídos da água, contribuindo para a purificação de fontes hídricas.
Além disso, as nanoenzimas contribuem com a aceleração da degradação de pesticidas em solos agrícolas. Pesticidas são amplamente utilizados na agricultura para controlar pragas e doenças, mas seu uso excessivo pode levar à contaminação do solo e das águas subterrâneas.
Nesse sentido, as nanoenzimas atuam como catalisadores biológicos, aumentando a velocidade das reações químicas que degradam esses pesticidas, tornando-os menos nocivos ao meio ambiente.
Um exemplo notável dessa tecnologia é o uso de nanopartículas de óxido de ferr, que são injetadas em aquíferos para desintegrar cloroetano, um solvente industrial tóxico. O cloroetano é um composto químico frequentemente utilizado na limpeza de metais e na fabricação de plásticos, e sua presença em aquíferos pode representar um risco significativo para a qualidade da água.
As nanopartículas de óxido de ferro reagem com o cloroetano, quebrando-o em compostos menos perigosos e contribuindo para a descontaminação das águas subterrâneas.
Plantas fitorremediadoras
Algumas plantas possuem a notável capacidade de acumular ou metabolizar poluentes, oferecendo soluções naturais para a descontaminação ambiental.
O girassol (Helianthus annuus), por exemplo, é uma planta conhecida por sua capacidade de absorver metais pesados, como chumbo e urânio, do solo. Isso é possível graças ao seu sistema radicular extenso e à sua grande capacidade de acumulação de biomassa, que permite a extração desses poluentes das áreas contaminadas.
O vetiver (Chrysopogon zizanioides) é outra planta com propriedades descontaminantes. Amplamente utilizado em áreas rurais, ele é eficaz na filtração de agrotóxicos presentes no solo e na água. Suas raízes longas e densas criam uma barreira natural que impede a dispersão de poluentes, protegendo as fontes de água subterrânea e contribuindo para a melhoria da qualidade do solo.
Além disso, o tabaco (Nicotiana tabacum) tem sido geneticamente modificado para aumentar sua capacidade de absorver mercúrio, um metal pesado extremamente tóxico. Assim, pesquisadores têm trabalhado no desenvolvimento de variedades de tabaco capazes de acumular mercúrio em suas folhas, que pode ser removido e descartado de maneira segura.
Essa biotecnologia inovadora oferece uma alternativa interessante para a remediação de solos contaminados por mercúrio, que é uma preocupação ambiental significativa devido à sua persistência e toxicidade.
Poluentes emergentes e biorremediação
Poluentes como fármacos, microplásticos e PFAS (produtos químicos eternos) representam desafios significativos para a biorremediação tradicional devido à sua persistência no meio ambiente e à dificuldade de decomposição. No entanto, diversas soluções inovadoras têm sido desenvolvidas para enfrentar esses desafios.
Os consórcios microbianos, que são misturas de bactérias e fungos, têm mostrado grande potencial na decomposição de resíduos farmacêuticos. Esses consórcios trabalham de forma sinérgica, quando diferentes microrganismos colaboram para degradar compostos complexos presentes em medicamentos, transformando-os em substâncias menos nocivas.
Essa abordagem pode ser aplicada em estações de tratamento de águas residuais para reduzir a carga de resíduos farmacêuticos que chegam aos corpos d'água.
Os biofilmes são comunidades microbianas estruturadas que têm a capacidade de degradar microplásticos presentes nos oceanos, uma ameaça crescente à vida marinha.
Os biofilmes se formam na superfície dos microplásticos, e as enzimas produzidas pelos microrganismos ajudam a quebrar as partículas plásticas em componentes menores, eventualmente levando à sua degradação completa.
Além disso, os PFAS, conhecidos como produtos químicos eternos devido à sua resistência à degradação, também são um grande desafio para a remediação ambiental. No entanto, avanços na biotecnologia têm possibilitado o desenvolvimento de microrganismos geneticamente modificados que podem degradar esses compostos.
Como atuar nessa área?
A biotecnologia ambiental não é apenas uma ferramenta para despoluir o planeta, mas uma revolução na forma como encaramos a relação entre humanos e natureza. Por isso, especializar-se nessa área significa liderar projetos que unem inovação, sustentabilidade e impacto social.
Se você quer fazer parte da geração que transforma crise ambiental em oportunidade, invista em uma pós-graduação EAD em biotecnologia. O planeta (e o mercado) agradecem!