Prof. Marcelo Polacow, vice-presidente do CRF-SP, fala sobre os riscos do “kit covid” para a saúde, em meio ao aumento pela procura desses medicamentos.
“A Covid-19, doença causada pelo vírus SARS-CoV-2, apresentou pico de crescimento no Brasil no mês de março de 2021, com alto índice de contaminação e mortalidade. A situação atual é grave, contudo, isso não justifica a publicação de protocolos de tratamento sem a devida comprovação científica”, aponta o Prof. Dr. Marcelo Polacow, coordenador dos cursos de pós em Farmácia da Pós EAD São Camilo.
Recentemente, medicamentos do chamado “kit Covid” tiveram uma alta de vendas, mesmo não havendo comprovação científica para o tratamento precoce da Covid-19. Como exemplo, a hidroxicloroquina teve um aumento de 173% e a ivermectina, de 700%, tão grande é o impacto da Covid-19 na indústria farmacêutica.
“É importante destacar que a venda desses medicamentos sem prescrição médica contraria a legislação vigente, o que pode impactar em processos cíveis e éticos”, comenta o professor.
Muitas pessoas estão fazendo uso de alguns remédios de forma equivocada e, até mesmo, sem a prescrição de um médico. Essa ação é um tanto perigosa para a saúde do indivíduo, já que ainda não existe um tratamento precoce para a doença.
“Até o presente momento, não existem trabalhos científicos que comprovem a efetividade na prevenção ou no tratamento precoce da Covid-19”, comenta o professor Polacow, sobre o uso da cloroquina/hidroxicloroquina, da ivermectina e da azitromicina.
As únicas medidas válidas são o uso de máscara, a higienização das mãos, o distanciamento social e a vacinação.
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Uso da hidroxicloroquina e da ivermectina
Sobre o uso desses medicamentos, o Prof. Marcelo Polacow destacou alguns pontos importantes.
Em relação ao uso da cloroquina/hidroxicloroquina:
• O fármaco apresenta reações adversas graves, como retinopatia e distúrbios cardiovasculares;
• Há risco de aumento do prolongamento do intervalo QT, aumentando o risco de ocasionar uma arritmia potencialmente fatal;
• Devem ser utilizadas com cautela em pacientes com distúrbios cardíacos, hematológicos, hepáticos, neurológicos, renais e gástricos, e não é recomendada a sua utilização em gestantes, devido à ausência de estudos que avaliam a segurança desse medicamento nesse grupo de pacientes.
Em relação ao uso da ivermectina:
• Somente houve comprovação da ação antiviral desse medicamento in vitro.
• Já foram descritas adaptações dos parasitas com o uso da ivermectina, ou seja, a sua utilização de forma descontrolada poderá causar processos de resistência ainda desconhecidos.
• A utilização da ivermectina acima da dose terapêutica recomendada (200 mcg/kg) pode causar reações adversas preocupantes, como confusão, mudança no estado mental, problemas de equilíbrio e dificuldade para caminhar. Ela ainda pode promover alterações visuais e erupções na pele.
• O uso da ivermectina pode causar aumento na frequência cardíaca e dificuldade respiratória. Essas reações adversas podem ser confundidas com os sintomas da Covid-19, prejudicando o correto diagnóstico médico e, assim, dificultando o tratamento do paciente.
• A ivermectina utilizada em associação com a azitromicina apresenta uma interação medicamentosa preocupante: aumento da concentração plasmática da ivermectina, em torno de 30%, fato que intensifica as suas reações adversas.
• Entidades e instituições como FDA, NHI e Associação Médica Brasileira, assim como o laboratório Merck (um dos detentores da patente da ivermectina), já se manifestaram contrários ao uso de ivermectina e de outros fármacos no tratamento precoce da Covid-19.
Papel do farmacêutico nesse momento
“Consideramos que a decisão sobre a prescrição é uma prerrogativa do médico, mas cabe ao farmacêutico esclarecer ao paciente para que serve o medicamento e a forma de uso, orientando-o sobre os riscos da utilização”, aponta o Prof. Polacow sobre o papel dos profissionais em Farmácia diante dessa situação.
Além disso, segundo Polacow, caso haja necessidade de realizar a dispensação, deverá implantar medidas para garantir o acompanhamento farmacoterapêutico e a avaliação de eventuais reações adversas com a respectiva notificação, gerenciamento e intervenção rápida, como o encaminhamento precoce desses pacientes para o acompanhamento médico, para que possam ser tomadas as medidas clínicas pertinentes.
“Esse é o papel que cabe a nós. Não somos entregadores de caixinhas, somos profissionais do medicamento”, destaca o professor.
Segundo o professor, a disseminação de informações falsas, as chamadas fake news, sobre o uso racional de medicamentos também vai contra o código de ética dos farmacêuticos.
“Destaca-se que o uso racional de medicamentos sempre foi uma bandeira da profissão farmacêutica, que conhece claramente os riscos da utilização de medicamentos sem necessidade e lutou durante anos para que esse conceito fosse difundido para a sociedade e também para outros profissionais de saúde”, conclui o professor Polacow.
Fonte: Informe Técnico do CRF-SP
Marcelo Polacow Bisson
Tem graduação em Farmácia Industrial pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto - USP (1988); mestrado em Farmacologia e Terapêutica pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba - Unicamp (1991) e doutorado em Farmacologia e Terapêutica pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba - Unicamp (1996). Especialista em Farmácia Hospitalar pela Sociedade Brasileira de Farmácia Hospitalar - SBRAFH. Experiência nas áreas de Farmácia Hospitalar, Farmácia Clínica, Nutracêutica Clínica e Farmacologia, com ênfase em Farmacoeconomia e Pesquisa de Desfechos. Membro da SBRAFH. Vice-Presidente do CRF-SP, mandatos 2008-2011 e 2020-2021. (Texto retirado da plataforma lattes).